Protagonista – André Bustamante
A história deste bimestre é do hoteleiro André Bustamante que começou na hotelaria através de um intercâmbio e hoje atua como Gerente de Projetos e Processos da Rede de Hotéis Deville.
Trajetória
Com dez anos de carreira, André lembra como tudo começou. Sua primeira experiência na hotelaria foi fora do Brasil, durante um intercâmbio de trabalho nos Estados Unidos no final de 2004: “meus primeiros trabalhos foram como Camareiro e Stewart durante 4 meses em um hotel cassino de grande porte, com cerca de 1.000 apartamentos. No ano seguinte, retornei ao mesmo empreendimento, onde trabalhei por mais 4 meses como recepcionista. Quanto eu tive que escolher o segmento em que iria trabalhar no exterior, não demorei muito para optar pela hotelaria, pois era algo que eu já tinha bastante interesse em conhecer na prática. Antes disso, minha experiência profissional na área de formação (Turismo) era de estágios em alguns outros setores, como balcão de informações em pontos turísticos e na Infraero, onde prestava auxílio aos passageiros no desembarque internacional. Quando retornei para o Brasil e vim para Curitiba, não pensei 2 vezes antes de procurar emprego. Fui direto nos hotéis da cidade em busca de uma oportunidade, que felizmente apareceu rapidamente. Em menos de uma semana, lá estava eu na recepção, onde fiquei por 8 meses antes de passar para área de reservas”. Hotelaria é assim: se você ama, é impossível fugir 😉
Oportunidade
E neste caminho não faltaram oportunidades para André, ele mesmo diz “me considero também um cara de sorte”. Ele enfatiza que a experiência no exterior foi um divisor de águas em sua vida, tanto profissional como pessoal: “foram meses intensos, de muito trabalho (17 horas/dia) e aprendizado, que me fizeram amadurecer pessoal e profissionalmente.
Felizmente consegui aplicar muito do conhecimento que adquiri para alavancar minha carreira na hotelaria nacional. Além disso, foi na segunda vez em que trabalhei nos EUA que conheci minha esposa (estamos juntos desde então, há 8 anos). Quando contamos nossa história, parece um roteiro de filme. Somos naturais de estados diferentes (ela de SC e eu do RJ), e até hoje brincamos que tivemos que sair do país para nos conhecermos, pois aqui dificilmente isso iria acontecer. Sem dúvida alguma, esta experiência internacional abriu muitas portas na minha vida.”
Já na Deville, ele comenta sobre a grande oportunidade que teve de trabalhar no projeto de implantação de um dos sistemas da rede: “aprendi muito sobre as funcionalidades do software, dei sequência à atualização e criação de manuais do sistema, e assim passei de coordenador da central de reservas para analista de processos, o que fez com que eu visitasse as unidades aplicando treinamentos do sistema para os colaboradores. Foi nesta época, com o conhecimento que adquiri, que passei a analisar e aplicar melhorias nos processos operacionais da rede, explorando ao máximo os inúmeros recursos que a ferramenta nos possibilita fazer. Até hoje acabo dando algum suporte sobre o sistema para alguns usuários, sempre que surge alguma dúvida incomum. Para mim, é um reconhecimento bacana sobre o trabalho que realizei há alguns anos atrás. Sem contar que é sempre bom relembrar algumas coisas sobre o sistema, já que acabo não utilizando-o diretamente na função atual”.
Mudanças e descobertas
Nestes dez anos de hotelaria, André observou transformações em sua carreira e mais importante, na maneira como ele vê as coisas. O gerente destaca a mudança de percepção sobre a formação que se recebe em casa, dos pais: “em diversos momentos difíceis, longe da família, me deparei com situações em que os valores e os princípios que herdei e construí ao longo dos anos foram fundamentais, não só para as minhas decisões, mas sobretudo para lidar com a consequência delas. Creio que isto foi um dos principais combustíveis na minha carreira profissional, aliado à uma série de oportunidades que foram surgindo no caminho.”
Ah, eu te amo!
Em que momento André percebeu que a hotelaria era sua grande paixão? Ele conta que sempre se sente realizado quando vê coisas acontecendo a partir de esforço coletivo e que considerando sua posição atual, a paixão tem sido renovada diariamente:
“Esse sentimento de realização é ainda mais gratificante quando temos que tirar leite de pedra. A dinâmica e a natureza da operação hoteleira são fatores que certamente nos proporcionam estes desafios. Na minha posição atual, porém, os desafios são outros. Uma iniciativa mal executada pode gerar grandes impactos em toda a organização, portanto exige mais planejamento e definição de diretrizes para maximizar a chance de sucesso do nosso esforço. Foi a partir do momento que me dediquei para as atividades de planejamento e gestão que me senti “em casa”. Sou essencialmente analítico e planejador em tudo o que faço. Então, após muito tempo longe do “olho do furacão”, percebi que apesar de ser estimulado pela rapidez e agilidade necessárias na operação, me sinto bastante confortável em dedicar horas de trabalho, dentro da hotelaria, em atividades de planejamento, análise e melhorias para o sucesso da organização”.
Gratidão
“A experiência internacional abriu muitas portas na minha vida, e com certeza nada disso teria sido possível se não fosse pela oportunidade que meus pais me proporcionaram. Serei eternamente grato pelo esforço e pelo apoio incondicional que eles me deram e me dão até hoje”.
Futuro
Sobre seu futuro, André comentou que está revisando suas metas, já que acabou de concluir uma pós-graduação e assumir uma nova responsabilidade na Deville.
“Recentemente passei a assumir também a gestão de projetos da empresa (consolidando a área de “Projetos e Processos” da Rede), e agora é preciso construir mais uma estrada para que possamos colher mais frutos. O alinhamento entre estes dois modelos de gestão (Projetos e Processos) para o alcance dos objetivos estratégicos da organização é um grande desafio, mas que tem grande potencial de sucesso. Além disso, gosto do ramo acadêmico, e por isso tenho planos de médio e longo prazo de concluir um MBA, um mestrado e dar aulas.”
Curto e não curto
O que André mais curte na hotelaria é o fato de que é possível fazer com que as pessoas levem coisas boas quando partirem. O que o admira é toda a complexidade que há por trás disso, ele comenta: “o trabalho para que cada hóspede seja tratado não como um número de CPF ou RG, mas com nome e sobrenome, desejos, interesses, preferências, etc.”
Ele não curte e fica incomodado quando há indiferença na prestação de qualquer serviço: “é espantoso como um “bom dia” sincero e simpático, ou como valores tão importantes como o respeito e a compaixão, são deixados de lado nesta relação de cliente e prestador de serviço”.
Causos da hotelaria
Todo hoteleiro tem uma boa história para contar e a do André aconteceu quando ele trabalhava como recepcionista em um hotel cassino nos Estados Unidos. Um erro que se tornou aprendizado para a vida inteira ;). Confira o relato:
“Era uma enorme propriedade, se comparado com os padrões brasileiros (1000 apartamentos), e com intenso movimento de hóspedes e clientes frequentadores do cassino. Tínhamos uma média de 100 check-in’s dia/por recepcionista, em um quadro composto por 6 a 8 pessoas por turno.
Logo no meu primeiro mês, ainda aprendendo a mexer no sistema, com aqueles inúmeros comandos e combinações no teclado – Ctrl+F10, Shift+F11, Alt+F12, etc – fiz o check in de uma família de 6 pessoas (2 adultos e 4 adolescentes). Ocorreu em um horário que alguns de meus colegas estavam fazendo intervalo, e os demais não tinham tempo nem de olhar para o lado, por causa da imensa fila de espera.
Não me restou alternativa, e rapidamente iniciei o check-in. Eis que, para meu desespero, o pai se apresenta no balcão portando, nada mais, nada menos, que o mais alto cartão ultra-mega-blaster-top de fidelidade do cassino! Consultei no sistema (após alguns minutos tentando lembrar dos códigos Ctrl+Alt+Del…rs) e constatei que ele tinha cerca de USD 900 mil em créditos acumulados. Não era pouca coisa. Tratava-se de um cliente 1.000 X VIP para o hotel.
Respirei fundo, tentei não demonstrar que estava suando frio, e para minha felicidade fiz um atendimento excelente, rápido, simpático e sem grandes problemas (até aquele momento). A família pediu que deixássemos as malas na suíte pois eles nem iriam subir ao apartamento (foram direto se divertir nas mesas de jogos e caça-níqueis pelo cassino). Naquele dia fui para casa feliz da vida, contando vitória aos colegas brasileiros que também trabalhavam lá.
No dia seguinte, quando me apresentei na Recepção para iniciar o turno, imediatamente comecei a ouvir burburinhos de que algo muito sério havia acontecido na noite anterior (comecei a suar e rezar para que não tivesse nada a ver com meu trabalho). Não demorou muito para que meu supervisor me chamasse para contar que eu simplesmente havia esquecido de dar check in no sistema. Daí em diante, não preciso nem dizer que a Lei de Murphy (fiel à hotelaria) acompanhou aquela família durante um bom tempo naquela noite. Após muitas horas jogando pelo cassino, com uma tremenda maré de azar – depois eu soube que eles gastaram USD 20 mil sem ganhar nada – eles finalmente se recolheram para descansar, e ao chegarem no apartamento, não conseguiram entrar. Voltaram na Recepção, pediram para refazer as chaves, mas foram surpreendidos quando o Recepcionista informou que aquele apartamento já estava ocupado, e que, àquela altura, a reserva deles estava como “no show” e eles não tinham apartamento nenhum.
O hotel (e a cidade) estavam lotados (como não podia deixar de ser). As malas deles (que foram sim colocadas no apartamento), depois foram retiradas por um mensageiro que fez o check-in dos outros hóspedes que entraram. O mensageiro trouxe as malas de volta para o maleiro, sem identificação, e por causa da correria, esqueceu de avisar sobre a retirada e dar o devido tratamento ou investigação. Depois de muitas reclamações e algumas ligações do supervisor noturno, eles finalmente foram acomodados em um outro apartamento (de categoria inferior) que havia sido liberado durante a madrugada. Saíram cedo pela manhã, depois de reclamarem muito para o Gerente de Hospedagem. Não foi fácil trabalhar no dia seguinte, ouvindo todos os funcionários do hotel comentando sobre o ocorrido.
Este foi o meu “batismo” na hotelaria. Já se passaram quase 10 anos, mas até hoje penso que se eu tivesse oportunidade, faria questão de me desculpar pessoalmente com todos daquela família. Mas faz parte do jogo e hoje dou risadas. Pelo menos nunca mais cometi esse erro (rs)”.
Em poucas palavras …
Cidade natal: Petrópolis – RJ
Uma inspiração: O exemplo de liderança, persistência e sucesso de Bernardinho (Técnico de Vôlei) e Nelson Mandela.
Destino favorito: Qualquer um em ótima companhia.
Livro favorito: Não tenho um favorito, mas “Transformando suor em ouro” (Bernardinho), com certeza me fez sair da zona de conforto para perseguir meus objetivos. “O Alquimista” (Paulo Coelho) também exerce grande influência na maneira como enfrento as consequências das minhas escolhas.
Tá faltando na hotelaria …: Olhar e melhorar os processos de negócio sob a perspectiva dos clientes, de uma forma integrada dentro da organização. Quanto mais ampla for a visão sobre o processo “ponta a ponta” do cliente, mais eficazes serão as melhorias e inovações realizadas pela organização (isso parece simples e óbvio, mas na prática é bem diferente).
Hospitalidade é …: Fazer com que as pessoas levem coisas boas na memória quando partirem.
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Este ano iniciamos no Disque9 a série “Protagonista”, em que contamos a história de gente que entrega o máximo de si e faz a hospitalidade acontecer todos os dias. São trajetórias profissionais de hoteleiros que fazem a diferença!
Ah! E se tiver alguma história para contar ou quiser indicar alguém para estar nesta série, mande sua sugestão para: alo@disque9.com.br